25 de Abril de 1974 – 49 Anos de Democracia
Opinião

25 de Abril de 1974 – 49 Anos de Democracia

Comemorou-se recentemente o 25 de Abril em Portugal. Já temos 49 anos de uma Democracia que precisa ser muito melhorada. Nessa altura, tinha oito anos. Frequentava a Escola do Cerrado na 2.ª classe. Adorava a escola e os meus amigos (até hoje). Naquele dia, a nossa professora Marília, chegou perto de nós e informou-nos que os alunos que viviam perto do arraial, ou outras zonas de Paços, teriam de frequentar a escola da Praça no ano letivo seguinte. Do que me lembro, é que começámos todos a chorar, a dizer que não queríamos sair daquela escola…, mas teve de ser.

Tudo isto porque aconteceu o 25 de Abril e as coisas tinham mudado. As crianças tinham de frequentar a escola da sua área de residência.  A minha professora chamava-se Luísa, a quem nós tratávamos carinhosamente, por D. Luisinha. A nível escolar, não tive problemas.  Inclusive tenho também colegas ainda hoje da escola da Praça.  Tenho poucas recordações, mas não foi um ano mau de todo. No ano seguinte, voltei para a Escola do Cerrado, e foi um dos meus melhores anos. Tenho muito boas recordações dessa altura.

No entanto, esse ano foi marcante.  A palavra ‘Liberdade’ foi amplamente pronunciada. As pessoas andavam mais livremente, e, exprimiam-se sem medo. Era uma época muito diferente. Havia mais tempo, as amizades eram mais verdadeiras, as pessoas eram muito diferentes. Tínhamos menos, mas éramos muito mais felizes.  Não tínhamos telemóveis, nem tantos brinquedos. Tínhamos regras, horas para chegar a casa, brincávamos na rua com os amigos, os primos. Íamos a casa uns dos outros.

Já na adolescência, íamos a magote para todo o lado, de camioneta, de comboio, ou boleia.  Um dos nossos lugares preferidos era a Quinta do Engenho Novo.  Quando havia problemas, resolviam-se, e ficava tudo bem. Se na escola nos portávamos mal, quando chegávamos a casa, tínhamos castigo. Apesar das muitas restrições, a liberdade, foi conquistada a par e passo. Também tínhamos a nossa rebeldia, mas não batíamos ou desrespeitávamos os professores, como hoje.  Também fazíamos partidas, muitas asneiras e, não eram poucas…

Com o 25 de Abril, as mulheres, conquistaram muitos mais direitos. Começaram a trabalhar e, a ter mais liberdade. Começaram a tratar mais de si próprias, a ter mais tempo para si, e a viver mais a vida. Começaram a ter mais oportunidades, a estudar mais, e a valorizar-se mais.  A sua situação está melhor, mas ainda muita falta a fazer:

Os ordenados têm de ser mais altos;

O facto de ser mulher e, por estar grávida, não dá o direito de ser despedida por isso;

A pilula veio dar mais autonomia às mulheres, e ao número de filhos que pretendiam ter;

Para as mesmas habilitações as mulheres são preteridas aos homens; 

As mulheres hoje, devem valorizar-se mais elas próprias. A maternidade não é o seu único objectivo;

Ainda há uma mentalidade que tem de ser melhorada em todos os aspectos;

Etc.

Desde o 25 de Abril, alguns valores foram esquecidos, e substituídos por outros muito menos valiosos, perdeu-se o respeito por nós próprios e pelos outros. Apesar da vida estar “aparentemente “mais facilitada, não está mais fácil. Hoje temos acesso a quase tudo, sem grande esforço.

A sociedade mudou de tal maneira, que tudo e todos são “dispensáveis” facilmente.  A educação, deixou de ter regras.  Muitos pais e educadores, descartaram-se da sua responsabilidade e passaram-na para os familiares, professores e amigos.  Os professores têm como função ensinar, e não educar. Fazendo um parêntesis:  na escola e no secundário, os trabalhos eram feitos e cartolina, diversos materiais; escritos á mão e tínhamos de usar a nossa criatividade para ter boa nota.  Hoje, basta ir ao “google” e tirar e colar, e o trabalho já está feito quase por si. Muitos pais ajudam os seus filhos a fazer alguns trabalhos mais elaborados, mas é bom despertar a curiosidade e criatividade dos filhos. Isso compete ao seio familiar. As crianças devem ter regras, nem demais, nem de menos.  

As crianças têm demasiada tecnologia desde que nascem, muitos brinquedos, e muita solicitação exterior. Nós adultos, infelizmente, também sofremos desse mal.  Estamos todos a perder a capacidade de olhar o outro cara-a-cara, de o tocar, de o abraçar, etc. As emoções são traduzidas por desenhos (emogies). Assusta-me ver crianças pequenas, sentadas a maior parte do tempo, a mexer no telemóvel, apáticas, indiferentes a tudo.  Mesmo a capacidade manual é menor, assim como a criatividade. Há mais facilidade em tudo.  Hoje elas raramente recebem um “não”, ou não levam uma sapatada, porque não se “bate”, ou simplesmente, não são castigadas, não se lhes nega nada. Resultado:  criam-se “monstrinhos” e futuramente “monstros”, “adultos intolerantes, perdidos, sem rumo”.

Actualmente, julgo que estamos a retroceder.  Comenta-se tudo e mais alguma coisa, nas redes sociais, sem pensar no outro. Inclusive, há programas de televisão, que comentam qualquer facto que aconteça, ou uma frase ou uma declaração que se faça. Apenas somos da nossa verdade “não da verdade total”.  Há que ter cuidado. Um dia comentamos, no outro somos comentados.

O Covid, veio por a nu muitas verdades escondidas. Poderia ter melhorado muita coisa, mas isso não aconteceu.  Estamos todos muito mais cruéis, mais frios, insensíveis, os sentimentos desapareceram. Só se pensa na fama e na glória, no destaque. Faz-se qualquer coisa por “5 minutos de fama”.

Em 49 anos de Democracia em Portugal, alterou quase tudo:

A corrupção aumentou;

A política é bastante desinteressante;

Quem vai para a política, facilmente se corrompe;

O povo português trabalha muito e ganha cada vez menos;

Quem lucra, são sempre os mesmos: políticos, administradores, quem ocupa altos cargos….

Com a guerra na Ucrânia, a vida aumentou grandemente. Há cada vez mais desigualdade. Hoje “sobrevive-se”.

A televisão (em qualquer parte do mundo, também em Portugal) dá programas muito violentos, muito desporto, muita guerra; muitos reality shows, programas sem conteúdo, vazios.

Os desenhos animados, os cinemas são muito violentos;

As famílias não se entendem, há cada vez mais maus-tratos de pais para filhos, e vice-versa, entre o casal e as pessoas em geral.

Mesmo os animais são muito mal-tratados. Não são coisas, são seres vivos que merecem todo o respeito. Também se passou a um exagero, em que os animais são mais bem tratados que as pessoas…

As pessoas estão confusas, não se entendem;

Em 2024, faremos 50 anos. Ainda somos uma democracia que precisa de crescer. Mudar tanta coisa, e essencialmente, a nossa mentalidade retrograda. Há uma enorme desigualdade de classes. Os pobres cada vez mais pobres e os ricos cada vez mais ricos. Se não mudarmos, a nossa sociedade será algo vago e desinteressante, em que o vale é o dinheiro, a fama, a posição social. Seremos capazes de mudar? Creio que as novas gerações terão um papel decisivo. Talvez não seja para já, mas a ver vamos…

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Mary Rosas

contributor
COLUNISTA
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