O Bom, o Mau e o Vilão, em Alta Velocidade
Artigos por Jornalista Opinião

O Bom, o Mau e o Vilão, em Alta Velocidade

Tiago de Oliveira Paiva

Membro da Assembleia Municipal pelo Bloco de Esquerda

Dia 13 de junho de 2023, reuniu em sessão extraordinária a Assembleia Municipal (AM) de Santa Maria da Feira tendo como ponto único da ordem de trabalhos a ‘Consulta Pública – Estudo de Impacte Ambiental referente ao 1.º troço do projeto da Nova Linha Ferroviária de Alta Velocidade entre Porto e Lisboa’. Este ponto foi motivado pela consulta pública do projeto ‘Alta Velocidade – Fase 1: Troço Porto-Soure’, a decorrer até 16 junho, e pelo facto de a solução apresentada como a mais favorável no Estudo de impacte Ambiental (solução 2.5V) ter um impacto bastante significativo no território de Santa Maria da Feira, afetando 89 edificações (31 habitações, 52 anexos e seis Indústrias/serviços) nas freguesias de Espargo, S. Miguel de Souto, Rio Meão, São Paio de Oleiros e Nogueira da Regedoura. Acresce que, segundo o Executivo Municipal, esta solução coloca em causa compromissos urbanísticos e perspetivas de investimento na ordem dos 100 milhões de euros e a fixação de 1200 postos de trabalho no território. 

Na apresentação do ponto, o executivo municipal apresenta-nos a Infraestruturas de Portugal (I.P.) bem ao estilo do western spaghetti de Sergio Leone. A I.P. surge como O Vilão que, ignorando todo o argumentário do executivo municipal, desconsiderou os investimentos previstos, a fixação de postos de trabalho e as propostas alternativas apresentadas em sede de concertação.

Na discussão que se seguiu, todos os partidos com assento na AM foram unânimes: a solução apresentada como a mais favorável no Estudo de Impacte Ambiental não serve os interesses dos Feirenses, afeta a população de forma indelével nas mais variadas dimensões da sua vida e colocaram-se alinhados com a proposta do executivo na afirmação da solução de trajeto alternativo (B6) como aquela que interessa ao concelho de Santa Maria da Feira. Mas como não poderia deixar de ser, questionaram Emídio Sousa em diversos pontos da proposta, dos quais gostaria de destacar dois: (1) quais os detalhes e os projetos específicos que preconizam o investimento de 100 milhões de euros ‘ignorados’ pela I.P. e mencionados, sem detalhe, na proposta do executivo?; e (2) qual o cronograma da apresentação de uma proposta alternativa, introduzida como A+B, e que, segundo o executivo, obteve aprovação em sede de concertação com o Município de Ovar e teria sido desconsiderada pela I.P.?

E foi a “Alta Velocidade” que o presidente de Câmara, Emídio Sousa, tentou não responder a nenhuma das questões apresentadas pelas deputadas e pelos deputados municipais. E ‘a ferros’, lá foi dando mais alguma informação que, em vez de esclarecer, ainda confundiu mais a quem o ouvia. Afinal, os investimentos de 100 milhões não podiam ser muito mais detalhados porque ainda estariam em sigilo negocial e afinal a proposta A+B pode nunca ter chegado ao papel. Tudo isto torna difícil perceber como é que se podem avaliar investimentos sem se saber bem o que são, e como é que é possível propor reavaliar uma alternativa A+B, que afinal pode nunca ter sido formalmente apresentada em primeira mão. Com o devido cuidado interpretativo, falta-nos alguma informação para afirmar taxativamente que este Executivo é O Mau deste enredo, mas tudo aponta para essa conclusão. Seja pela incompetência ou pela falta de proatividade na defesa dos interesses das e dos feirenses, a ação da Câmara Municipal deixa muito a desejar.

O papel d’O Bom desta AM está reservado ao povo, às e aos feirenses que em massa se fizeram representar e sentir na sala. Ainda que o regimento da AM não permita a Intervenção do público numa sessão extraordinária, a sua presença silenciosa foi ensurdecedora, responsabilizando todas e a todos os autarcas pela sua representação. Estes feirenses vão sofrer com a solução que reúne parecer favorável no Estudo de Impacte Ambiental. Caso se venha a confirmar esta opção como aquela a adotar, têm direito a receber da Autarquia todo o apoio na defesa dos seus interesses e no minimizar do impacto desta obra pública nas suas vidas. E é na defesa dos seus interesses, que faremos chegar à Mesa da AM o pedido para que nos sejam facultados todos os documentos relativos à matéria debatida, nomeadamente, os projetos de investimento ignorados pela I.P., bem como a solução de trajeto de Alta Velocidade descrita como alternativa (A+B), acompanhada da avaliação inicial fornecida pela I.P. em sede de concertação. A experiência tem-nos sugerido que O Mau é mesmo mau, vamos ver se não será também O Vilão.

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Tiago Paiva

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