Lia Ferreira
Eleita Municipal de Santa Maria da Feira
Como já vem sendo hábito o presidente demissionário da Câmara Municipal (CM) de Santa Maria da Feira (SMF), publicou mais um artigo de crítica às políticas do Governo socialista.
Os artigos de crítica, assinados pelo presidente, não são novidade. Há muito que desenhava a sua entrada nas listas a órgãos nacionais, pelo PPD-PSD, assinando artigos de crítica voraz a todas as políticas do governo socialista.
A única novidade neste processo, sejamos realistas, é o alvo das mais recentes críticas — as políticas nacionais de habitação. Como se fosse um problema que só afeta o nosso país.
É conhecida a crise na habitação na Europa que há décadas se vinha a adensar. No entanto, em Portugal, o governo do PS tomou esta problemática como prioridade da agenda nacional. Para solucionar o problema identificado, iniciou um investimento, sem precedentes, procurando reverter uma situação que nenhum Governo de direita ousou tentar resolver.
Pela primeira vez, desde o 25 de abril de 74, surgiu um Programa Nacional de reformas para as políticas de habitação, complementado por uma linha de financiamento que apoia diretamente municípios e privados.
Lendo o artigo assinado pelo, ainda, presidente, torna-se necessário relembra-o que foi durante os seus mandatos como vereador, vice-presidente e presidente, com maiorias governativas, que SMF chegou à crise habitacional em que se encontra atualmente.
Ao longos dos anos, o PS de SMF, tem vindo a alertar, advertindo para a necessidade de os executivos municipais definirem políticas locais direcionadas para a habitação. Foram várias as reuniões e iniciativas em que, o PS de SMF, pedia aos executivos liderados pelo PSD que investisse em políticas de apoio para a fixação de jovens no Concelho, incentivadoras de estabilidade, ao nível dos preços do mercado de arrendamento.
Aos feirenses teria sido mais útil que o presidente tivesse feito o trabalho, conforme era sua competência, em vez de assinar artigos de crítica às políticas nacionais.
Gostaríamos de ter visto, no terreno, a aplicação de políticas municipais ajustadas às necessidades locais. Tal como é esperado de um presidente de CM, preocupado com o Município que representa.
Quando elegemos um presidente de Câmara estamos, também, e acima de tudo, a eleger um gestor de políticas locais. Alguém com capacidade de nos colocar na vanguarda e de prevenir problemas e com a competência de apresentar soluções que mitiguem dificuldades de contexto, ajustadas às necessidades da comunidade.
A legislação nacional e os pacotes de financiamento externo (fundos europeus e Orçamento de Estado) serão, sempre, um complemento e reforço para as políticas municipais, nunca a única resposta no terreno.
É isso que desejamos para o nosso Concelho. No entanto, lamentavelmente, o executivo municipal opta por se apoiar, exclusivamente, nas respostas e recursos disponibilizados pelas entidades públicas, IPSS e pelo setor privado. A pandemia deixou esse modo de atuação a descoberto. Temos bem presente a memória de, quando questionado sobre as medidas municipais para fazer frente à emergência sanitária e social local, a resposta não tardou: “gerimos os meios e recursos disponibilizados pelas entidades”.
Segundo os Censos 2021, os 135.964 habitantes de SMF distribuem-se por 62.470 habitações com a tipologia apartamento e moradia, 35 habitações improvisadas (barracas e casas rudimentares) e 31 alojamentos coletivos (de apoio social, lares, de saúde, prisionais, religiosos, entre outros).
O parque habitacional feirense, 73,9% é ocupado pelos seus proprietários e, apenas 9,3% se destinam-se à venda, arrendamento e outros casos.
Fica uma ajuda construtiva ao presidente que escolheu abandonar o cargo, antes do fim do seu mandato. Deixe orientações para que o seu executivo aproveite o financiamento do Programa de Recuperação e Resiliência negociado pelo governo PS.
Estruturem programas de arrendamento, reabilitação, construção e promoção de um parque habitacional mais alargado. Apostem num ambiente habitacional inclusivo e sustentável, com soluções energeticamente eficientes e de baixo impacto ambiental. Criem incentivos para a utilização de energias renováveis e de rentabilização de recursos naturais.
Adquiram lotes para a construção de novos complexos habitacionais. Apliquem a, ainda possível, redução do IMI e implementem um programa de arrendamento dedicado à fixação de jovens e medidas de incentivo à construção de habitações para a classe média.
SMF precisa de programas de habitação social de rendas de custo controlado, para famílias mais cadenciadas e de incentivos fiscais para estimular a reabilitação de edifícios antigos.
Seria muito bem-vinda a criação de uma linha de financiamento para projetos de regeneração urbana sustentável. Cada vez mais se faz sentir a necessidade de um programa municipal de reabilitação urbana com apoios direcionados para a requalificação de habitações devolutas e de edifícios antigos. Nesse sentido, faria toda a diferença a promoção de parcerias público-privadas destinadas à construção de projetos habitacionais acessíveis e inovadores.
Para suprir as necessidades sentidas, é fundamental que a CM seja capaz de apresentar critérios claros, para o planeamento e construção de novas áreas residenciais. Áreas de coexistência entre diferentes opções de tipologias construtivas, de acordo com as características das freguesias.
De forma a impulsionar o comércio local, é fundamental privilegiar a construção de empreendimentos mistos, com unidades habitacionais, espaços comerciais e serviços descentralizados. Serviços mais próximos dos feirenses, esse deve ser o nosso grande desígnio.
No âmbito da transparência e eficácia das medidas, seria pertinente que a CM estabeleça indicadores de desempenho para avaliar o progresso das políticas municipais para a habitação.
Independentemente das políticas nacionais, as autarquias são as entidades gestoras de um município. Em SMF essa gestão, de responsabilidade exclusiva do PPD-PSD, tem deixado muito a desejar. Apesar das maiorias sucessivas, as políticas municipais têm semeado práticas desajustadas às necessidades.