Mãe, quando for grande tenho de ser Trump, Meloni, Le Pen, Milei, doutor ou engenheiro?
Opinião

Mãe, quando for grande tenho de ser Trump, Meloni, Le Pen, Milei, doutor ou engenheiro?

Há uns anos valentes contaram-me uma história sobre os caladinhos, história que até hoje não sei se é verdade embora deseje muito que assim seja. Para todos os efeitos, decidi acreditar nela porque me enche de orgulho nas nossas gentes, coisa que o facto de a direita estar no poder desde sempre me envergonha. Envergonha por um motivo simples, não resulta de uma verdadeira escolha popular ou do espelho de uma vontade livre, mas de uma rede de dependências e estruturas que na verdade aprisionaram a população à ilusão da escolha. Todos nós conhecemos alguém que trabalha na Câmara ou em empresas municipais, que depende da Câmara Municipal para o seu negócio sobreviver ou para ter emprego, num concelho outrora de pleno emprego, agora refém de um partido que construiu as suas redes de influência de tal forma que muita gente depende de um emprego no Município para sobreviver.

Pese embora nem conheça os candidatos, os vereadores, as figuras políticas. Até um fardo de palha podia estar na lista, a estrutura está tão bem montada que difícil será desmontá-la (e podemos esperar sentados noutro fardo de palha com este PS na oposição no executivo).

Voltando à história, o nosso município é dos poucos que nunca conheceu outro poder local que não o PSD, daí que exista cada vez mais uma tentativa de apagar da história o 25 de abril e que o fez (e que o Correio da Feira felizmente recuperou nos 50 anos que a Câmara Municipal ignorou olimpicamente). Contaram-me que na cozinha do que penso que seria o Café Castelo (não estou certa se era), se fariam reuniões clandestinas de organização da resistência contra o fascismo para derrubar a ditadura. De cada vez que alguém entrava no café – com grande probabilidade de ser a PIDE (vou poupar uma piada óbvia sobre os bufos e os seus descendentes), para avisar quem estava na reunião se diria à entrada do café respondendo às inquisições que lá atrás se faziam ‘CALADINHOS’, para proteger os resistentes antifascistas. Terá aí nascido o nome de um dos nossos ícones da pastelaria, e depois disto imagino que comecem a ser profundamente indigestos para alguns políticos da praça.

Será uma das histórias que a ser verdade seguramente o PSD na sua tradição democrata (cof cof) tenderá a enterrar, para continuar a fazer de Santa Maria da Feira a capital dos parasitas.

É verdade. Já repararam que desde os mais ricos de Portugal e do mundo (à custa de várias centenas de pobres nas suas fábricas para fazer cada um dos ricos) até à organização e congressos de tudo quanto é o exemplo cabal da falta de noção sobre o mundo e a realidade (entre Iniciativas Liberais, Chegas e outras anedotas, centros de doutrinamento de ódio e intolerância, fábricas de mentiras – em vez de fábricas de rolhas a ver se diziam menos idiotices – de notícias falsas e ideologias falhadas – cuidado os bebés que ainda se comem ao pequeno almoço, muito cuidado) a colóquios com esses exemplos de mérito e idoneidade que são os Paulos Portas e Bugalhos da vida (entre violência doméstica e submarinos, continuo a achar que podiam era ir aprender a manejar a broca das rolhas para ver se falam menos ou pelo menos ganham alguma vergonha no que dizem e em como dizem), o nosso município e o seu Europarque tornaram-se a capital nacional dos parasitas.

Esses que vivem do ódio, da mentira, da pobreza dos outros e do seu trabalho.

Já quase não há fábricas por cá, mas os donos continuam ricos. Mas nunca vi um operário da corticeira Amorim a gabar-se da sua riqueza, mas com contratos diários, com dedos arrancados pelas máquinas e a fortuna dos Amorins sempre entre as maiores do mundo. Até a cara de cortiça feita pelo Vhils paga pela Câmara vale mais que vários anos de salário de tantos feirenses que ali trabalham ou trabalharam. Mas a estes trabalhadores, sempre lhes ouvi que tinham que votar em doutores e engenheiros., os do partido da câmara, os que têm o poder.

Trocando por miúdos (calma, não escondam os bebés, o pequeno almoço era piada, só bebo café), os parasitas. Os que vivem à nossa custa. Os que vivem à custa de quem trabalha e apregoam o mérito, a capacidade e sempre foram levados ao colo. Que profissão conhecem ao presidente da câmara? Aos vereadores do seu partido? Quantas vezes os a fazer colóquios com trabalhadores ou a falar com eles? A falar dos corticeiros, sapateiros, dos trabalhadores das fábricas que fecharam ou das mulheres a receber o salário mínimo toda a vida enquanto fazem o que de mais nobre existe que é cuidar de idosos, doentes, crianças e tantos, mas tantos idosos deixados à sua sorte nas IPSS?

Pois, mas o PSD decidiu servir de barriga de aluguer esta gente ignorante que no parlamento bate os pés, grita, dá murros, e do alto dos seus mais de 3000 euros mensais e 800 por cada deslocação afirmam que o problema são os pretos, os brasileiros, os ciganos, as mulheres que querem abortar em vez de estar em casa a arrumar e cuidar dos filhos.

Não pensem que o PSD é diferente de um qualquer parasita destes. Já foi o tempo. E não falo de cor. Passei anos da minha vida dedicada a lutar contra esta gente – a defender os filhos de um homem negro morto aos 38 anos com seis balas despejadas em cima. Porquê? Porque era negro. A defender jovens torturados e violentados por agentes da autoridade porque são negros. Não odeio a polícia, odeio nazis e ignorantes. Respeito as forças policiais que desempenham as suas funções com dignidade e honra. Que não batem numa mãe negra nem dizem nas redes sociais que se vão vacinar contra a raiva porque foram mordidos por «um animal».

E é isto que este PSD, este, o da nossa terra, está a promover, a dar palco, a convidar para conversas mascarando o discurso de intelectual, de defesa do mérito e do empenho. Empenho em explorar quem menos tem e menos pode? Empenho em dizer que em razão da nacionalidade alguém é preguiçoso e trabalha pouco? Empenho em dizer que ninguém pode entrar no país. Então e nós? Tu, sim, tu que ainda estás a ler: quantas pessoas da tua família emigraram? Quantas pessoas conseguiram tirar um curso e trabalham a recibos verdes? E tiraram mais e mais cursos e recebem 1000 euros? Estão desempregados? Não têm casa e não sabem se conseguem pagar renda? Quantas pessoas conheces de outras nacionalidades? Levam-te o emprego e o dinheiro? Quantos milhões levou o Salgado, o BPN, a TAP, o Galamba e o lítio, o PSD e a privatização dos CTT? Estás melhor não estás?

Não vou fingir que sei o que é ser vítima de racismo, ser torturada, ser baleada porque sou de outra cor, ser agredida porque sou de outro país, ser mandada para a minha terra. Mas sei o que é ser comunista, o que é ser mulher, o que é viver do meu trabalho, o que é ficar sem nada porque não fico calada com injustiças e ser alvo de mentiras. E aqui estou, de pé e certa de que é justa a causa pela qual luto.

O que me assusta é ver o ódio a ser normalizado. Nazis no poder. Inglaterra e França já perceberam – este caminho leva à barbárie, à violência, à destruição e a nada mais do que isso. O que me assusta é ver as crianças da minha família a quem estamos a deixar isto como futuro.

O que me assusta é ver que a minha cidade é sempre palco dos encontros destes monstros. E ninguém parece preocupar-se. Pelo contrário. Mas um dia, quando vos baterem à porta por causa da orientação sexual da vossa filha, da cor do vosso filho, da nacionalidade da vossa mulher, saberão que é tarde demais.

Por isso, pés ao caminho. Não somos engenheiros, doutores, monstros. Somos seres humanos e depende só de nós – apenas e só – o futuro que estamos a construir. Caladinhos devem estar os parasitas que continuam, contar pobres para fazer ricos. E são os povos que fazem os seus destinos, não os Milei, os Trumps e os amigos com maus penteados. Só precisamos de nos convencer disso. O resto, será a história – escrita por nós.

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