Em causa está a contratação de docentes que são funcionários da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira. As entidades visadas – EPPB e Câmara Municipal – garantem que os horários de desempenho dos dois cargos em simultâneo, por parte de “dois funcionários [públicos] no ano letivo 2023/24”, não entram em colisão e estão em consonância com a legislação em vigor
Com a direção pedagógica da Escola Profissional de Paços de Brandão (EPPB) a ser assumida por Cristina Tenreiro, presidente da Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira, um munícipe acusa o estabelecimento de ensino de se ter tornado, desde então, “no bastião do PSD de Santa Maria da Feira”.
“Desde a sua posse, vários funcionários da Câmara Municipal da Feira, sobretudo os afetos ao PSD, bem como outros membros deste partido, tornaram-se docentes desta escola, num péssimo exemplo dos vícios promíscuos da política”, justifica a acusação, levantando, de seguida, várias questões: “os funcionários da Câmara Municipal lecionam, nesta escola, no mesmo horário (08h30-17h) em que, supostamente, deviam exercer as suas funções de funcionários públicos na Câmara Municipal da Feira, ou seja, os horários colidem. ‘Estão’ virtualmente em dois locais ao mesmo tempo, auferindo de duas fontes distintas, ambas provenientes de fundos públicos: Estado Português e POCH (Programa Operacional Capital Humano). Este facto confere gravidade acrescida, pois se os referidos funcionários têm tempo e permissão para exercer funções em simultâneo, pode-se concluir que não têm nada para fazer na Câmara da Feira, pois sobra-lhes tempo para estes expedientes cumulativos”, pode ler-se, acrescentando ainda que “professores com mais de 20 anos de casa, à qual entregaram o seu suor, know how e competência, perderam imensa carga letiva, entregue a este ‘gang da política’”.
Para o munícipe, “a política de contratação de recursos humanos desta escola, financiada pelo Estado Português, alicerça no compadrio, no favorecimento indecoroso dos ‘amiguinhos da política’ e na troca de favores”.
Contactada pelo Correio da Feira, a Escola Profissional de Paços de Brandão esclareceu que “no ano letivo 2023/24 foram dois os funcionários da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira que exerceram funções de formadores na EPPB”. “Estes funcionários solicitaram acumulação de acordo com a legislação em vigor [artigos 19º a 24º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de junho] e lecionaram um 75 horas e outro 100 horas. Os horários ao longo do ano foram flexíveis e elaborados de acordo com a disponibilidade dos formadores e complementares com o horário de trabalho na Autarquia”, refere a direção, deixando uma nota sobre a política de contratação da EPPB, que tem como “principal objetivo a incorporação de mais valor e de mais competência”. “Após a identificação das necessidades é feita a divulgação na net -emprego e a seleção/recrutamento é efetuado após análise curricular e entrevista, ou por convite, nas situações em que se pretende uma qualificação profissional mais específica. Mais se informa que a EPPB procura ter especialistas de excelência, com formação especializada aliada a uma valorização profissional, com grande experiência e competência no terreno. É a situação destes dois funcionários, com especializações e doutoramentos na área da Cultura e do Turismo que foram e são uma mais-valia para a EPPB e para o Curso Técnico de Animação em Turismo”, acrescenta.
Solicitámos ainda esclarecimentos à Câmara Municipal, que começou por comentar que “todas as pessoas, trabalhadoras ou não da Câmara Municipal, são livres e têm o direito de escolher a sua filiação partidária, religião ou qualquer outra condição e, portanto, desde que não colida com o bom desempenho profissional, a vida pessoal dos seus trabalhadores não diz respeito à Câmara Municipal”. Contudo, disse ter conhecimento “de um trabalhador que submeteu a aprovação desta Autarquia, através da sua Divisão de Recursos Humanos, um pedido de acumulação de funções para docência, ainda em vigor, tendo lecionado na EPPB. No ano letivo passado, um outro trabalhador da Câmara Municipal lecionou na EPPB, tendo igualmente pedido acumulação de funções à sua entidade patronal, a Câmara Municipal”. Não obstante, garante que os horários de desempenho dos dois cargos em simultâneo não entram em colisão, pois foi “atribuída isenção de horário”. “Ou seja, durante uma semana normal de trabalho, tem de cumprir as 35 horas que o Código de Trabalho prevê, não estando, no entanto, obrigado a fazer o horário rígido da Câmara Municipal (das 9h às 17h)”, explica.